No seu livro, “The Undervalued Self” (ainda sem tradução em português), a dra. Elaine Aron…
Ser altamente sensível e sentir-se responsável pelos sentimentos alheios
Sim, eu sei que este é um daqueles títulos que pode parecer incompreensível para alguém que não seja altamente sensível. Como assim, sentir-se responsável pelos sentimentos dos outros? Se os sentimentos são dos outros, logicamente eu não posso ser responsável, não é? É sim. O raciocínio está correto, só que não é assim que funciona na (nossa) prática. Embora saibamos que não somos responsáveis pelas emoções dos nossos amigos, parceiros, parentes, colegas etc., muitas vezes assumimos a tarefa de assegurar sua felicidade ou bem-estar. Nos desdobramos para garantir que estejam felizes, mesmo às nossas próprias custas.
Ocorre que, como uma pessoa altamente sensível, os sentimentos das outras pessoas afetam você. E muito. Você capta o seu estado de humor através de expressões faciais, tom e energia. Daí a se sentir responsável por animá-las quando sente que elas não estão bem, é apenas um passo. Como demonstra este depoimento:
Percebe? Nosso desejo é o de “simplesmente” apagar a dor ou o desconforto da outra pessoa. Neste esforço, chegamos ao ponto de absorver os seus sentimentos e assumi-los como se fossem nossos. Esta é uma das características associadas ao traço. E, por isso mesmo…
Não dá pra evitar
E por que não? Você pode estar se perguntando. Simplesmente porque nós, PAS, somos biologicamente equipados para a percepção do Outro. Não acredita? Pois bem, um dos mais conhecidos estudos sobre as PAS, realizado na Universidade de Stone Brooke, utilizou scanners para monitorar a atividade do cérebro de pessoas altamente sensíveis e não altamente sensíveis, enquanto observavam determinadas imagens.
Os resultados mostraram que muitas partes do cérebro das PAS se tornam mais ativas em um contexto social. Em comparação com o cérebro dos não altamente sensíveis, o cérebro das PAS demonstrou uma atividade bem mais acentuada não somente nas áreas associadas à empatia, como os neurônios-espelho, como também, naquelas ligadas à consciência. Nas PAS estas áreas se tornaram muito mais ativas em resposta a imagens de outras pessoas, principalmente quando estas imagens exibiam pistas sociais ou emocionais. A conclusão dos cientistas é que as pessoas altamente sensíveis tornam-se muito mais alertas, quase “mais conscientes”, em um contexto social.
Podemos dizer que, para as PAS, as outras pessoas são o objeto mais brilhante no seu radar. Nós estamos mais sintonizados com as sutilezas das outras pessoas e somos altamente receptivos a tons de voz, gestos de mão, expressões faciais ou até mesmo a maneira como alguém se move de um jeito diferente com base em seu estado mental. E, quando não estamos atentos, nós podemos absorver as emoções dos outros, como se fossemos uma esponja.
Mas pode causar problemas… 😥
Imagino que eu não preciso lhe dizer isso, não é? Se você é uma PAS fortemente empática certamente já conhece (ao menos alguns) dos problemas que esta identificação profunda com os sentimentos dos outros pode trazer. Um deles é a facilidade em se deixar contaminar pelo clima de um determinado ambiente, principalmente aqueles que são emocionalmente carregados. Outro problema comum é absorver os sentimentos da outra pessoa numa tentativa de fazê-la sentir-se melhor. Se você já passou pela experiência de sair completamente esgotado(a) após o encontro com um amigo que procurou você para “desabafar”, sabe exatamente do que estou falando.
Outro problema é que este excesso de empatia pode levar você a ignorar suas necessidades/desejos e se transformar no “quebra-galhos-oficial” de todo mundo, numa tentativa de assegurar que todos estejam felizes. Todos menos você, é claro. Contagiar-se do estado de ânimo das outras pessoas não apenas faz com que as PAS saibam exatamente o que elas estão sentindo, como também com que se sintam na obrigação de fazer tudo que seja possível para animá-las e fazer com que esses sentimentos negativos desapareçam, para que assim elas também possam se sentir melhor.
O problema é que neste afã de ajudar podemos nos esquecer de algumas coisas importantes. A primeira delas é que nenhuma pessoa pode (ou deve) assumir a responsabilidade pelos sentimentos de outra. Cada um é dono do seu próprio caminho. É disso que trata o “livre arbítrio”. A segunda coisa é que, por vezes, a ajuda externa pode tirar de alguém a oportunidade de aprendizado que viria da experiência de superar por conta própria aquele problema (ou sentimento).
E, por fim, há o sentimento de culpa irracional que costuma acompanhar muitos altamente sensíveis, quando, por qualquer razão, não foram capazes de doar aquilo que as outras pessoas desejavam – tempo, dinheiro, atenção, apoio emocional, etc. – da maneira que elas desejavam e no momento em que elas desejavam. Este pode se revelar um grande obstáculo na tarefa de aprender a delimitar o âmbito da sua responsabilidade, pois leva as PAS a se sentirem egoístas, principalmente quando precisam dizer “não” às outras pessoas.
A solução? autoconhecimento e autocompaixão
Ainda que você não acredite, a empatia é um presente. Uma característica maravilhosa que permite a você (ou a mim) se conectar profundamente com as pessoas e ajuda-las quando precisam de alguém para ouvi-las. Entretanto, pode ser um fardo pesado se você não aprender a manejá-la sem ficar sobrecarregado(a). Mas, aprender é a palavra-chave aqui, porque esta é uma habilidade que pode (e deve) ser adquirida. Portanto, todos nós podemos aprender.
Pronto(a)? Então aqui vão 05 dicas para não se deixar colapsar pelas emoções das outras pessoas.
1. Reconheça que sua sensibilidade é parte de você.
Uma vez que você já percebeu que não pode simplesmente “desligar o botão” de sentir o que os outros estão sentindo, proponho trabalhar a partir da aceitação da sua característica. Continuar tentando “não ser tão sensível” é uma atitude que apenas lhe gera mais estresse e rebaixa a sua autoestima. Então, ao invés de lutar contra a sua sensibilidade, concentre-se em criar um estilo de vida que se adapte à sua natureza sensível e aprenda a cuidar melhor de si mesmo(a).
2. Explique suas necessidades para as pessoas que você ama
Por vezes você vai precisar de um tempo a sós, seja para processar os sentimentos que absorveu dos outros, seja para separar e identificar suas próprias emoções. Explique isto para as pessoas queridas. Quando você comunica suas necessidades, por exemplo, para seu parceiro(a), ele(ela) entende por que você está se retirando (ou ficando em silêncio) e percebe que não se trata necessariamente de algo pessoal, a respeito dele ou dela.
O outro lado também é verdadeiro. Quando você perceber que uma pessoa querida está irritada ou de mal- humor evite presumir que, necessariamente, é algo relacionado a você. Aguarde que o outro também tenha o seu tempo de processamento e, no momento certo, pergunte gentilmente se há um problema entre vocês ou se há alguma coisa que você possa fazer para ajudá-la.
3. Esteja atento(a) à sua resposta emocional
De modo geral, quando sentimos emoções fortes, sejam nossas ou captadas de outras pessoas, temos a tendência a responder de forma imediata. É como se a nossa mente estivesse tentando consertar o que está nos fazendo sentir mal (e agora mesmo!). Com isso recaímos nas reações automáticas: dar o que a outra pessoa está pedindo a qualquer custo, absorvermos a sua irritação ou depressão ou fugirmos o mais depressa possível do lugar e da pessoa. É aí que a atenção plena se revela uma ferramenta incrivelmente poderosa para apoiar nossa natureza altamente sensível.
Atenção plena, neste contexto, significa reconhecer a emoção, ao invés de tentar negá-la ou reprimi-la. E perceber a quem ela realmente pertence. Então, da próxima vez que se sentir subjugado(a) por emoções muito intensas, tente fazer o seguinte:
A atenção plena pode ser muito útil para as PAS. É preciso alguma prática, mas se você puder aceitar o que está sentindo sem tentar afastá-lo à força, torna-se mais fácil lidar com estes sentimentos.
4. Tenha compaixão pelo seu eu sensível.
Quando você tem a tendência a absorver as emoções dos outros, a autocompaixão é algo imprescindível. Afinal, é bastante difícil suportar o peso dos sentimentos das outras pessoas, além de tudo aquilo que está acontecendo na sua própria sua vida. Por isso, pratique ser o amigo mais amoroso e incondicional que você possui. Aceite que você não pode evitar completamente “pegar” as emoções de outras pessoas, e que por isso às vezes pode ter dificuldade em fazer o que é necessário para cuidar de si mesmo(a), mesmo sabendo racionalmente que isto é importante. E lembre-se que não está sozinho(a) nessa experiencia.
Aqui estão três ideias para ajudá-lo a praticar a autocompaixão:
5. Priorize suas necessidades emocionais
Como as pessoas sensíveis estão mais sintonizadas com as emoções, podemos usar essa percepção intensificada para reconhecer nossas próprias necessidades emocionais. Necessidades pessoais devem vir em primeiro lugar, se queremos estar bem, para nós e para as pessoas que amamos. Isto pode ser feito de várias maneiras. Descubra o que lhe faz bem e agarre-se a isto como uma tábua de salvação, porque, na verdade, é isto que as práticas de autocuidado representam: sua tábua de salvação no mar revolto das emoções intensas.
Por fim, queria lhe dizer que, apesar da dor e do desconforto que a nossa empatia pode ocasionar, ela também é uma parte importante de nós. Uma parte que nos permite desfrutar de relações pessoais intensas e profundas. Acredito que podemos aprender a viver melhor com este dom e que é nossa responsabilidade fazê-lo. Espero que este artigo possa lhe ajudar neste caminho.
E, se quiser conhecer mais algumas dicas, dê uma olhada neste vídeo do meu canal no youtube:
Responsabilizar-se pelos sentimentos alheios
Beijos e Bênçãos e até o próximo mês,