De modo geral, para nós PAS, é muito difícil dizer não. Basta começar a pensar…
Você não é sensível demais!!!
Imagino que você, como eu, já deve ter ouvido muitas vezes a frase: “Não seja assim. Você é sensível demais!” Esta frase pode ser a avaliação de alguém às suas reações, sejam elas sensoriais ou, principalmente, emocionais. Seja quando você reclama do barulho, seja quando está se sentindo esgotado(a), seja quando reage de maneira emocionalmente intensa ao comportamento de outras pessoas, etc.
Se você é como eu, acredito que ao ouvir esta frase tenha se sentindo fraco(a) e tenha visto nela a comprovação de que realmente existe “algo errado” com você. Pois bem, neste artigo desejo afirmar que você não é sensível demais e que não há nada errado com você. Vem comigo.
Em primeiro lugar, quero te chamar a atenção para o fato que eu não disse que você não é sensível, disse que você não é sensível demais. Afinal de contas, quem define o que é demais? Quem tem o direito de julgar você e a sua sensibilidade? Com que critérios é feito este julgamento? E você pode me responder, “Ah, Rosalira, o julgamento é feito com base no que a maioria das pessoas pensa”. E você tem razão. Quando nos dizem que somos sensíveis demais geralmente o critério que está sendo usado é o modo como vivem as outras pessoas. Os outros 80% da população que tem um sistema nervoso diferente do nosso e, portanto, não pode, realmente, compreender a nossa experiência do mundo. E esta é a primeira coisa que você precisa entender de maneira muito clara: O critério não é adequado a você. E a razão é que:
Somos diferentes dos demais
Uma pessoa altamente sensível tem um sistema nervoso mais responsivo. Isto a torna mais sensível a estímulos sensoriais – ruído, cheiro, textura, movimento e visão. Como resultado, elas processam mais informações e ‘sentem’ de maneira mais profunda. Uma vez que processam tudo que está no seu ambiente, e que fazem isto com mais profundidade que os demais, é absolutamente natural que sejam mais afetados, tanto pelo que há de bom pelo que há de ruim no seu ambiente. Isto não é ser sensível demais. Isto é ser aberto ao ambiente no qual se vive.
É por ser mais aberto que você se cansa mais rapidamente. É por ser mais aberto que você se magoa mais facilmente. É por ser mais aberto que você sofre mais com as injustiças do mundo. Mas, é por ser mais aberto(a) que você é o ombro amigo com o qual as outras pessoas sabem que podem contar. É por ser mais aberto(a) que você é profundamente empático(a). É por ser mais aberto(a) que você é profundamente comovido(a) por um pôr do sol ou por uma obra de arte. Entendeu?
Ser mais aberto lhe torna diferente, tanto nos aspectos positivos quanto naqueles delicados e desafiadores.
E esta é a nossa força e, também, a nossa debilidade
Por quê? Porque como diz a terapeuta Ilse Sand, vivemos em um mundo (cada vez mais) insensível. E não apenas para nós. Mas, para todas as pessoas, altamente sensíveis ou não. Vejamos alguns dados:
Eu poderia prosseguir nesta linha citando outros problemas de saúde, tanto física quanto mental que, de tão comuns, passam desapercebidos no nosso dia a dia, tais como insônia, palpitações cardíacas, úlceras e gastrites, etc. Mas, o que realmente importa é a sua opinião. O que você acredita que expliquem estes números? Será que todas estas pessoas são altamente sensíveis? Acredito que não.
Na minha opinião estes números indicam que não somos apenas nós que estamos sofrendo com o estilo de vida da chamada “vida moderna”: jornadas exaustivas de trabalho; excesso de telas; alimentos que não são alimentos; competição constante, ansiedade causada pela hiperexposição às redes sociais, etc. Tudo isto compondo o que o filósofo Byung-Chul Han chama de “sociedade do cansaço”.
Toda esta carga e toda esta pressão bombardeiam nosso sistema nervoso no não nos permitindo nem o tempo e nem o espaço para o descanso e a recuperação. Entre outras consequências, isto nos leva a um estado permanente de sobreestimulação, que é a causa raiz de grande parte dos problemas que citamos acima.
Mas, o que é mesmo sobreestimulação?
A sobreestimulação, ou hiperestimulação, ocorre quando seu sistema nervoso é bombardeado com mais estímulos do que pode suportar, resultando em diversos sintomas físicos e emocionais. Isso pode vir de várias fontes, desde ruídos e luz em excesso até uma sobrecarga de demandas emocionais ou mentais. Como resultado, o sistema nervoso fica desregulado.
No mundo atual, a sobreestimulação é uma constante na vida da maioria das pessoas. E de uma maneira ou de outra todos sentimos os seus efeitos. O que acontece com os altamente sensíveis é que nosso sistema nervoso é mais responsivo e, por isso, nos sobreestimulamos mais rapidamente. Por conta dessa diferença genética, nós sentimos com mais cedo e com mais intensidade um problema que afeta a todos. É como se nós fôssemos uma espécie de sensor de alarme que avisa que algo está errado. E a verdade é que algo está muito errado com a nossa sociedade. Afinal, se todos estamos esgotados, o problema não está nas pessoas, mas na estrutura na qual elas estão vivendo
Porém, como a maioria das pessoas não está consciente desse mal-estar coletivo, elas olham para nós e dizem que somos sensíveis demais. O mesmo estilo de vida que cria o problema também dificulta a sua percepção: vivendo nesta roda viva, passando de uma atividade para outra; se anestesiando com as múltiplas telas ou com os ansiolíticos e antidepressivos consumidos cotidianamente, a maioria das pessoas não tem tempo nem energia para questionar este estilo de vida. Assim, sendo elas acabam aceitando todo este mal-estar (as dores, o cansaço, a falta de energia e o burnout, etc.) como normal. A verdade é que elas estão desconectadas. E, por isso, afirmam que quem não aguenta este ritmo é “fraco”, “mimizento” ou “sensível demais”, entende?
Só que o problema não está em nós e nem nos outros 80% que não são altamente sensíveis. O problema está em uma estrutura social que nos afasta exatamente daquilo que alimenta a nossa alma: o tempo para reflexão; a convivência em família; a fruição da arte e da beleza, os encontros físicos com os amigos e por aí vai. Nesta perspectiva nossa dificuldade em nos adaptarmos à esta estrutura pode ser o maior sinal de sanidade.
Então, por favor, quando eu ou outra pessoa insistir em que você precisa fazer pausas, dormir mais, estar em contato com a natureza, perder-se num bom livro, desfrutar da companhia das pessoas que ama ou simplesmente não fazer nada, não pense que você é fraco(a) ou sensível demais. Não você não é “sensível demais”, ao invés disso você é uma pessoa conectada e desperta o suficiente para perceber o que outros estão tentando a todo custo ignorar. Pense como a sua sensibilidade é um fator de aviso, uma espécie de farol mostrando a toda a sociedade como poderíamos agir para resgatar as qualidades que nos fazem real e profundamente humanos.
Espero que estas reflexões lhe inspirem a rever a relação com o seu traço de personalidade e, quem sabe, o nosso papel no mundo. Nos vemos no próximo mês,
Beijos e bênçãos,